Há uma voz baixinha no fundo das nossas mentes que joga com as nossas maiores ansiedades, dando ao diálogo com ela uma qualidade viciante. Aqui está uma meditação guiada para ajudar a livrar-se do aperto de laços problemáticos do pensamento que nos mantêm atolados na autocrítica.

Esta prática de fato é sobre comunicar-se com o crítico interior e, a exemplo de Lilah, o primeiro passo é agarrar a voz quando ela se manifesta. Percebemos que o crítico vive em um mundo de absolutos, dispondo de pouco espaço para nuanças e áreas cinzentas. Suas palavras favoritas são deveria, sempre e nunca, e seu sistema operacional é culpar. “Você estragou tudo, você sempre faz isso.” “Você deveria simplesmente desistir.” “Você é tão diferente, ninguém jamais vai amar você.” “Você é tão falha que nunca será capaz de ajudar a si mesma, muito menos qualquer outra pessoa.” Em vez de criar um espaço amplo e aberto para abraçar nossas vidas, o crítico interior faz com que questionemos nosso próprio valor e entremos em colapso.

Para algumas pessoas, o crítico interior é uma voz específica do passado – sua mãe, sua tia, uma criança, o chefe que o demitiu. Meu amigo Joseph Goldstein ainda lembra do professor do ensino fundamental que lhe deu um grande F vermelho em recorte e colagem. (Isso foi na época em que se misturava farinha e água para fazer cola, e o trabalho de Joseph, pelo visto, ficou muito bagunçado.)

Um amigo ou um estranho pode soltar uma observação que entranhamos de tal modo em nossos corpos e mentes que ela passa a ser parte de nossa identidade. E quando, como no caso de Josephine, as vozes críticas foram repassadas como “heranças de família”, a identificação é ainda mais profunda. Tenho uma amiga que ouve a voz desdenhosa de sua mãe falecida há longo tempo – uma mulher que prezava a esbelteza acima de todos os atributos humanos –, toda vez que ganha alguns quilinhos. Paradoxalmente, às vezes essas vozes críticas podem até nos confortar, vinculando-nos com nosso passado e às pessoas mais importantes em nossas vidas. Os juízos daqueles que amamos ou admiramos fazem parte da nossa história e, se não os identificarmos quando surgem, eles se tornam os juízos que projetamos sobre outros tanto quanto sobre nós mesmos.

O mindfulness nos ajuda a ver o aspecto viciante da autocrítica – um ciclo repetitivo de esfolar-nos reiteradas vezes, voltando a sentir a dor. O crítico interior pode tornar-se um tipo de companheiro em nosso sofrimento e isolamento. Enquanto estamos nos julgando severamente, pode-se até ter a sensação de que estamos fazendo progressos contra nossas muitas falhas. Porém, na realidade, estamos só reforçando nosso senso de indignidade.

Contudo, quando começamos a prestar atenção, percebemos com que rapidez o crítico salta para dentro, mesmo quando acontece algo bom. Se as pessoas nos tratam como amigos, nosso crítico pode sussurrar que não ficariam muito tempo por perto se soubessem como somos inseguros e cheios de defeitos. Ou digamos que você acabou de correr uma maratona. Você está comemorando o fato de haver treinado, corrido e concluído a corrida? Ou você está se recriminando por ter sido a última pessoa a cruzar a linha de chegada?

Uma aluna me disse que logo após o nascimento de seu segundo filho, ela entrou em uma onda de autojulgamento porque sua casa estava bagunçada, ela não estava conseguindo cuidar da aparência nem passar a roupa. O ruído do seu autoabuso era tanto que se passou mais de uma semana antes de perceber que estava se comparando com sua mãe, uma mulher que sempre parecia com tudo em cima e mantinha uma casa impecável, apesar de ter dois filhos – mas acontecia que ela também dispunha de uma assistente do lar que vinha todo dia. A comparação é uma das armas favoritas do crítico. Felizmente o mindfuness é muito mais sábio e mais forte do que nosso crítico interior.

 

Meditação: lembrando o que temos de bom

Se você estiver ruminando as coisas de que se arrepende e os erros que cometeu, tente este exercício. Ele o/a ajudará a redirecionar sua atenção e lembras as coisas boas que há dentro de você. É importante não negar seus erros, mas se continuar a repassá-los, analisá-los, criar histórias em torno deles, você estará simplesmente reforçando a dor e a alienação que eles já causaram em você. Se identificar e refletir sobre uma boa coisa que seja a seu respeito, você estará construindo uma ponte para um lugar de gentileza e cuidado. Estar naquele lugar, incrementa nossa capacidade de olhar honesta e diretamente para tudo que é difícil e lhe dá energia e coragem para avançar.

Se alguma impaciência ou juízos emergirem durante essa meditação, não sinta isso como se tivesse falhado. Isso é bem natural. Simplesmente permite que a reação negativa se desfaça como uma onda na praia e veja se consegue retornar à contemplação positiva sem autocrítica.

Extraído do livro Real Love de Sharon Salzberg. Copyright © 2017 by Sharon Salzberg. Reprinted with permission from Flatiron Books. All rights reserved.

“Este artigo foi publicado originalmente no Mindful.org, uma organização sem fins lucrativos dedicada a inspirar, orientar e conectar qualquer pessoa que queira explorar a atenção plena. Clique aqui para ver o artigo original.”
Site: http://www.mindful.org/

Tradução: Nélio Schneider

Contato por e-mail: nelios.nho@terra.com.br

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